terça-feira, 29 de junho de 2010

Intuição

Todos estavam num clima de despedida, abraçam-se e beijavam-se embevecidos pela tarde maravilhosa que passaram juntos...

Quando acabam os estudos é assim. Vai cada qual pro seu lado, uns arrumam empregos, outros entram na universidade, outros ainda não sabem ao certo o que querem, mas algo é comum: a falta de tempo para o reencontro. Este é sempre caloroso se for amiúde, mas se demora muito tempo, parece que os assuntos escapam e que os gostos não são tão comuns.

Apesar de o encontro ter demorado um pouco mais, todos ficaram à vontade.
Os abraços eram bem apertados, daqueles de estralar a costela. As mensagens de bem querer eram rasgadas aos quatro cantos. Algo, em especial, marcou-me feito tatuagem. Foi um abraço que demorou mais que de costume e que veio acompanhado da frase: Eu não quero te soltar. Eu também não queria lhe soltar.

Somente entre amigos eu poderia sentar de perna aberta, falar as minhas garfes, expor sem medo as minhas idéias. A saudade já estava sendo fabricada e seria então embalada após a saída por aquele portão. Carregaria o peito de cada um ali e seria massacrada na próxima data marcada. Mas enquanto isso, ela massacraria nossos corações. Uma lágrima me veio ao canto do olho, mas não caiu. Como poderia uma frase dessas me causar tanto estupor, causou-me porque há veracidade nela, senti isso naquele abraço.

“Recentemente a física quântica fez uma descoberta surpreendente: duas partículas que caminham juntas, quando separadas no espaço, movem-se na mesma direção. É isso que acontece com duas pessoas conectadas emocionalmente. Quando uma delas precisa da outra, a outra sabe. A intuição é um elo entre elas.” *




*Entrevista à Sharon Franquemont, Revista VEJA.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Licença

-O que há com ele?

-Deve estar embevecido com as cores. É poeta, tem permissão para ser melancólico. Isso o afastou do seu lar, mas o manteve livre. Acho que ele pode mudar de idéia sobre qualquer coisa, sempre que desejar. Quando encontra alguém como você, tem liberdade para acreditar. E se você conseguir mudar a opinião dele, conquistá-lo, decerto ele sentará e porá essas idéias numa peça, ou poema e todos o admirarão por sua flexibilidade.




Diálogo do filme " Ponto de Mutação"

terça-feira, 1 de junho de 2010

Não é para você

-Você nunca dançou comigo. –Indagou a moça.

Os dois corpos começaram a balançar juntos. Não havia um ritmo definido, eles dançavam uma música própria.
Ela estava na ponta dos pés, sentia o vestido longo tocar os seus calcanhares. O tecido fino deslizava dando leveza aos movimentos. A maquiagem borrava, ela limpava o lápis preto que, minutos antes, destacava-lhe o olhar, mas agora só lhe enegrecia as faces. Sabia que aquilo só piorava as coisas, mas ela não podia se privar de ter sua primeira e última dança. Estava indecisa. Indecisão é quando você sabe muito bem o que quer, mas acha que deveria querer outra coisa.¹
Ele. Talvez nem passasse por sua cabeça o que estava prestes a acontecer. Não conseguia saber o que ela tanto pensava, o porquê do olhar perdido, do choro escuso. Ela não queria parar de dançar. Sabia que depois da dança teria que dizer algo, dar uma explicação para aquilo que ela não sabia explicar nem para si mesma. Ele parou de dançar, já não havia mais escapatória.
“Desculpa dançar quando deveria ser indiferente. Desculpa querer te beijar quando deveria dizer adeus.”
Esse discurso não existiu. Ela o engoliu a seco. Mas como ele não poderia ter existido? Se estava vivo dentro dela...
Ela sorriu, um riso que agredia seu rosto. Ambos foram até a porta, combinaram horários, como de costume, beijaram-se na despedida. Ele acenava convicto de vê-la no próximo fim de semana. E verá. Até o dia que ele conseguir ouvir no silêncio.
Vendo-o indo embora, pensava e repensava se era mesmo aquilo que queria: vê-lo partir. Sentou e esperou sentir a saudade, como se ela personificada viesse, chamando-a para mais uma dança.

- Quando ele irá perceber? –Indagou a moça.